Equipes vigiarão permanentemente pontos vulneráveis das três Terras Indígenas no rio Tapauá para coibir a pesca e a caça ilegais
No começo de julho, o povo Paumari começou o deslocamento das sete bases flutuantes de vigilância das aldeias para pontos vulneráveis em suas Três Terras Indígenas no rio Tapauá, dando início ao período de vigilância mais intensa, que costuma ocorrer entre julho e dezembro.
Com o avanço da vazante dos rios, e do verão amazônico, começa também a temporada de invasões. Os rios mais secos facilitam a pesca de pirarucu e outras espécies de peixe, e os lagos dos territórios, onde se concentram os pirarucus, precisam ser constantemente vigiados para impedir a pesca predatória.
Com o manejo sustentável de pirarucu, que desde 2013 tem apoio do Raízes do Purus, patrocinado pela Petrobras, os Paumari conseguiram estruturar um sistema de vigilância que tem sido eficaz no controle da invasão e da pesca predatória. Tanto que, entre 2009 e 2021, houve um crescimento de 631% na população de pirarucu em lagos dos territórios.
Unidos para cuidar do território
“Até eu ter uns 11 anos os rios aqui eram cheios de peixe. Foi na minha adolescência que o pirarucu e outras espécies como tambaqui começaram a ficar escassas”, lembra Francisco Paumari, de 38 anos, coordenador de pesca da Associação Indígena do Povo da Água, que representa os Paumari. Seus filhos, ele conta, cresceram sem saber o que era pescar essas espécies. Mas o seu neto de 6 anos já nasceu na fartura do pirarucu, cuja população foi recuperada pelo manejo sustentável.
Conhecido por todos como Chico, ele foi um dos primeiros pescadores do povo Paumari a apostar no manejo sustentável como alternativa para recuperar a espécie. “Tudo começou comigo e mais cinco companheiros. Nós fomos os pioneiros na vigilância dos lagos. Foi só quando os resultados começaram a aparecer que mais pessoas se juntaram ao trabalho”, explica Chico. O sucesso da iniciativa contagiou os Paumari. Em 2021, 128 pessoas participaram das atividades relacionadas ao manejo.
Hoje, o povo tem um sistema de vigilância constituído por duas modalidades: a vigilância em grupo e a vigilância em flutuantes. A primeira ocorre quatro vezes por ano. Em cada ocasião, um grupo de vigilantes indígenas percorre todos os pontos vulneráveis do território, e seus entornos. Já a vigilância em flutuantes acontece no período de seca dos rios, entre julho e dezembro. Nessa época, as bases ficam posicionadas em pontos onde costumam haver invasões, e as equipes, formadas pelas famílias paumari, se revezam em uma escala semanal de plantão nos flutuantes. “A gente vai pro flutuante com toda a família. Além de mim e do meu marido, vão meus filhos e filhas, suas esposas e maridos, e também os netos. Algumas vezes por dia parte da família sai de canoa para rondas nos locais onde costuma ocorrer a pesca predatória, e a outra parte fica vigiando os entornos do flutuante, e tomando conta da estrutura”, conta Margarida Paumari, do conselho de lideranças da AIPA.
Quando encontram algum invasor, a abordagem é pacífica, como explica Chico. “A gente tenta a via do diálogo, explicando que eles não podem pescar na área. A maioria aceita e vai embora. Mas muitos tentam voltar depois. Da mesma forma que a gente monitora eles,
eles estão de olho na gente. Por isso, temos que estar sempre atentos”, ressalta.
Conquistas
A estrutura com a qual os Paumari contam hoje para vigiar os seus territórios é uma conquista de seu comprometimento com o manejo sustentável de pirarucu. Aqueles que se envolveram no trabalho desde o início enfrentaram muitas dificuldades para monitorar as áreas invadidas. “A gente não tinha base de vigilância, então tinha que acampar na beira dos lagos, expostos ao sol e à chuva”, lembra José Lino Paumari, companheiro de Chico no grupo de primeiras lideranças do manejo.
Hoje, além de sete bases de vigilância flutuantes, construídas e reformadas pelos próprios Paumari, com recursos do Raízes do Purus e de outros projetos que apoiam a gestão dos territórios, a AIPA tem um flutuante de pré-beneficiamento de pirarucu, onde o peixe é limpo e eviscerado, para ser transportado até o frigorífico. “Estamos construindo mais dois flutuantes, um de vigilância, e outro onde será a cozinha da pesca. São muitas pessoas para alimentar, e a equipe de cozinha precisa de um espaço adequado para trabalhar no preparo das refeições”, relatou Chico. “Quando começamos a trabalhar, não tínhamos nada. E hoje eu olho pro tanto de peixe que nós temos, e as estruturas que nós temos, e fico emocionado”, comemora.
Sobre o Raízes do Purus
O projeto Raízes do Purus é uma iniciativa da OPAN, com patrocínio da Petrobras por meio do Programa Petrobras Ambiental, que visa contribuir para a conservação da biodiversidade no sudoeste e sul do Amazonas, fortalecendo iniciativas de gestão e o uso sustentável dos
recursos naturais das terras indígenas Jarawara/Jamamadi/Kanamanti, Caititu, Paumari do Lago Manissuã, Paumari do Lago Paricá, Paumari do Cuniuá e Banawa, na bacia do rio Purus, e Deni e Kanamari, no rio Juruá.
Sobre a OPAN
A Operação Amazônia Nativa foi a primeira organização indigenista fundada no Brasil, em 1969. Nos últimos anos, suas equipes vêm trabalhando em parceria com povos indígenas no Amazonas e em Mato Grosso, desenvolvendo ações voltadas à garantia dos direitos dos povos, gestão territorial e busca de alternativas de geração de renda baseadas na conservação ambiental e no fortalecimento das culturas indígenas.